domingo, 25 de setembro de 2011

Rapariga do Fogo - 3

Uma longa e curva bancada de madeira, assente sobre um terreno estéril, sem vida. Local medonho. Algumas das pessoas começavam-se a sentar, outras já se encontravam sentadas há algum tempo, estavam ansiosas para ver esta dançarina flamejante. Tal como eu queria. Ao dirigir-me para a bancada deparei-me com gente que conhecia, cumprimentei o pessoal, contudo o meu olhar dirigiu-se para um ser que se encontrava a ler.
Tinha umas lindas pernas e o seu parvo cabelo tapava-lhe o rosto. Avisei para que guardassem um lugar para mim e assim fizeram. É bom ter um grande amigo, um irmão que não é de sangue como ele. Podíamos contar um com o outro sempre que quiséssemos. Comecei a caminhar e aos poucos ela rasgava o olhar na minha direcção. Fugia à leitura para ver o que se aproximava, ocorria-me que podia estar a fazer algo estúpido, incorrecto, até porque eu não era assim. Só que fiquei curioso por ela ser a única a ler no meio de tanta gente.
Sentei-me ao seu lado e perguntei-lhe:
- Desculpa estar a ser incómodo, mas porque lês no meio desta gente e antes de um espectáculo fenomenal?
Ela lança-me um olhar esverdeado na minha pessoa. Oh caramba, não pode ser! Fingi que nunca a tinha visto, apesar da minha cara de surpreendido não conseguir esconder tal fingimento. Contudo, fez-se de despercebida.
- Leio para o nervosismo passar, gosto de ler bons romances. Mas olha que eu sei que me reconheces.
- Sim, também não era nada difícil não é? Eu também gosto de ler. Principalmente esse género de livros, porque esses permitem viver aquilo que não sou capaz de viver na vida real.
- Vocês, Homens são todos iguais, sem miolos e só pensam com a cabeça de baixo. Inventam mil e uma histórias para conquistar um troféu como uma mulher. Contudo, já houve uns há bocado que inventaram algo melhor do que tu. – Ela apontou na direcção deles e eu sorri.
- Menos mal, pensei que fosse pior. – Ela ri-se e eu também.
- Realmente, nunca pensei que alguém viesse falar comigo por causa de um livro, ao invés das minhas curvas. Desculpa se fui má para contigo.
- Não te preocupes, já é um hábito, não sou muito bom nesse tipo de coisas. Falta pouco para começar o espectáculo não é? O que vais fazer?
- Já está quase. Tens que esperar para ver.
- Assim o farei, será que depois poderíamos falar sobre o que estás a ler?
- Certamente.

M - Capítulo Quatro

Abri a porta, e revirei a cabeça para apreciar pela última vez naquele belo dia, o seu belo rosto. Sai caminhando pela rua em direcção a casa, ao longe podia ouvir a ignição dos motores a ser dada pela chave enquanto via o fumo a sair do tubo de escape a evaporar-se no céu e o carro a desaparecer na curva.
Tinha chegado a casa e a primeira coisa que fiz, foi correr em direcção ao computador e digitar o endereço da rede social que todos usavam na actualidade: www.páginasocial.pt , tinha sido fundada por um Português que investiu muito tempo a programá-la e a desenhá-la, de modo a criar uma rede social só para o povo Português. Durante um tempo foi um enorme sucesso mas depois perdeu-se para o Facebook.
Contudo, eu digitei o meu endereço de e-mail e a minha palavra-chave, fiz login, porque eu sabia ao certo que eu tinha-lhe adicionado no meu círculo de amigos, já lá iam uns belos meses. O que eu fazia para poder ver aquela mulher, vezes e vezes sem conta, de forma a passar despercebido.
Uma foto, outra foto e as imagens dos acontecimentos que tinham passado nesse dia, entravam-me na cabeça a velocidades estrondosas. O meu coração quase se rompia, novamente, de entusiasmo, mas tinha de me conter e esquecer aquilo que se passara.
Forcei a cadeira a ir para trás, de forma a poder-me levantar e afastar da secretária, daquelas imagens que já davam comigo em doido. O som do seu arrasto foi ensurdecedor, o velho chão de madeira pereceu danificado e marcado pelas pernas do assento.
- Mãe, dá uma olhada no esquentador. – O raio do esquentador por vezes tinha pancas e não trabalhava, um arranjo de cento e cinquenta euros derramados ao lixo. Mais valia tê-lo enviado para a fábrica e pagar um pouco mais pela qualidade do serviço ser cinquenta vezes melhor. De certeza que ficaria arranjado.
Dirigi-me à casa de banho, despi-me e contemplei o reflexo do meu corpo no espelho. Bombeei o meu sangue até aos meus músculos. Posei para mim mesmo, revi que zona muscular precisava de ser preenchida, treinada. Os ombros, o peito, os braços, costas, pernas, abdominais? Era a barriguinha que me faltava, o resto vinha por acertos, por treinos. Pequenas correcções.
Todos os dias repetia as mesmas poses, precisava de auto-estima, confiança para me sobrepor acima de tudo e todos. Ter força para vencer os problemas que apareciam dia após dia. O espelho começava a ficar embaciado, esqueci-me de que tinha ligado a torneira, de forma, a aquecer a água. Perdi-me no esforço que tinha de fazer para poder ficar com ela. Treinar, estudar e trabalhar.
O chuveiro fazia escorrer a água acima da minha cabeça, consequentemente pelo resto do meu corpo. O calor espalhava-se, aliviando cada milímetro de cansaço, de preguiça das minhas fibras musculares. A minha mente entrava num estado zen, ela tinha desaparecido do meu consciente, agora pensava em coisas mais importantes como a minha escrita, a minha família, as minhas ex-namoradas, os meus sonhos, os trabalhos da escola, os meus amigos, no meu desalinhamento de pensamentos, de conquistas e perdas.
De repente a água torna-se fria.
- P*ta que pariu, merda para isto, estava tão bem. – Gemi eu. Os músculos enrijecem, ela volta e por sua vez o tesão que ela me dá.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Rapariga do Fogo - 2


Eram umas vinte e uma horas, já tinha acabado de jantar. Depois de ter estado uma hora a arranjar-me para ir sair. Sai do quarto e fui perguntar à minha irmã se estava despachada, reparei mais uma vez na vela que estava no corredor, voltei a ter aquele rosto na minha cabeça, por uns breves instantes.
A minha irmã deu comigo a olhar para a vela e eu nem sequer tinha dado por ela, ou pela resposta dela. Já estava a reclamar comigo, porque tínhamos de nos despachar. Eu sou sempre a mesma coisa, lá pensei eu. Estava sempre atrasado, porque distraía-me facilmente ou então porque adormecia.
Descemos e já estava o meu melhor amigo, acompanhado pela namorada e a amiga da minha irmã, que já estavam à nossa espera há algum tempo. Tudo por culpa minha. Olhei para o relógio, um novo que tinha comprado, nada de especial. Afinal, ainda íamos a tempo do inicio do espectáculo, algo que eu não queria perder, estava irrequieto. Aquela rapariga…
Andámos uns três quilómetros a pé, com muita conversa pelo meio, umas sem pés e nem cabeça, outras que iam por acolá. Nada de outro mundo. Acabaríamos por chegar sem darmos conta. Aquele descampado estava, que se diga um “inferno”, podia andar de t-shirt se quisesse e nem apanharia uma única constipação, por mais pequena que fosse.
Na minha cabeça continuava a passear aquele rosto liso, sem falhas, perfeito. Tinha uns lábios carnudos, que daria a qualquer um uma vontade de beijar e de se perder por ali, os cabelos loiros pareciam ouro vivo, que davam riqueza ao seu olhar verde de primavera. Uma esmeralda de cabelos dourados. Tudo no seu rosto, era salientado por aquela forte chama. Não havia algo tão rico e, ao mesmo tempo, tão vivo como aquela rapariga. Eu ainda só lhe tinha visto o rosto, mas já imaginava mais ou menos como seria o seu corpo.
Não era algo que me interessava muito, mas imaginava um corpo esbelto, uma cintura um pouco larga, um peito um pouco grande e uma barriga do estilo “Danone”. Imaginava-a a dançar como se nadasse na água, com subtileza e harmonia. A fazer magia com o fogo, como se tratasse de um mágico. Só que ela dava vida, mas muita vida ao espectáculo.
Tudo fruto da minha imaginação, e oxalá eu não estivesse errado. Dirigimo-nos para a zona onde ia acontecer o espectáculo.

Rapariga do Fogo - 1


Acordei de manhã e já me encontrava atrasado para as aulas, sabia bem que não ia chegar a horas se fosse comer. Acabei só por lavar os dentes e sair de casa de forma repentina. Cheguei à escola num espaço de quatro minutos, fiz um enorme esforço para não chegar atrasado. Mas só um pouco, nada por ai além. Caminhei para a sala, e já sentia os meus pulmões a arder, porque não tinha aquecido, aliás era impossível de tê-lo feito.
Bati à porta. Pedi à professora para entrar e ela lá me deixou, apesar de ter estado a reclamar para que eu não chegasse mais tarde. Porque se não teria que fazer uns quantos trabalhos, para compensar esses pequenos atrasos.
Passado uns minutos, conseguia ouvir os meus colegas a falarem sobre um festival de pirotecnia. Onde existia uma rapariga loira, de olhos verdes, com um corpo elegante, em que se podia notar a perfeição das curvas do seu corpo e que tinha uma pequena tatuagem sobre o ombro direito, que dizia “Fire” ou Fogo.
Fiquei intrigado. Foi aí que comecei a pensar no quanto o Fogo me fascinava. Aquela chama que arde sem parar dá-nos a sensação de poder, de controlo sobre algo que não está ao nosso alcance. O quanto eu já olhei para a “chaminha” de uma vela, durante minutos e minutos a fio.
Perguntei ao meu melhor amigo, se ele queria vir comigo e que até podia levar a namorada se quisesse, porque eu não me importava com isso. Só queria mesmo ver o espectáculo de pirotecnia. Combinámos para as vinte e duas horas.
Ao fim do dia, na ida para casa deparei-me com um cartaz, que tinha essa mesma rapariga. Ela estava a deitar fogo da boca, tinha que ser mesmo importante e especial, para ser a figura daquela noite.
Mais uma vez a chama, mas principalmente por poder vê-la pela primeira vez chamou-me atenção. Só vi o seu rosto, algo com que nunca me tinha deparado na vida. Ainda por cima, neste tipo de espectáculos.
Segui para casa e aquele rosto não me saía da cabeça. Era difícil tirá-la de lá por mais que tentasse, ela era como uma chama que se intensificava na minha mente. Cheguei a casa e avisei logo a minha mãe, de que ia sair à noite para ir ver o tal espectáculo. A minha irmã questionou-me se podia ir comigo e que ela levaria uma amiga dela para estarem juntas. Eu concordei, porque não haveria problema nenhum, certamente.